sexta-feira, 31 de março de 2023

Lira tromba com Pacheco, atropela a Constituição, não abre mão de comandar as MPs e paralisa o Congresso, deixando de votar medidas essenciais, como o Bolsa Família

Lula começa a dar sintomas de desgaste na relação com o presidente da Câmara

A mais recente crise institucional envolvendo o Congresso escancarou a dificuldade do governo em lidar com um ator político cada vez mais poderoso: Arthur Lira (PP-AL). Desta vez, o presidente da Câmara, que já vem dando claros indicativos de que não pretende facilitar a vida de Lula (PT) na Casa, age para barrar o retorno das comissões mistas destinadas à análise de Medidas Provisórias (MPs), em uma disputa acirrada por protagonismo com o presidente do Senado. Os deputados liderados por ele querem a manutenção do rito alcançado na pandemia de que a Câmara daria início às discussões das MPs, derrubando o dispositivo constitucional que obriga a discussão das medidas nas comissões com 12 deputados e 12 senadores. Lira diz que isso ofusca a Câmara e superdimensiona o Senado, admitindo ceder desde que sejam três deputados para cada senador. O ímpeto do deputado alagoano por mais poder para si e aliados só não surtiu efeito porque esbarrou em um Senado irredutível, já que a lei o favorece.

A avaliação entre governistas para o imbróglio é pessimista. O Palácio do Planalto avalia que, nesta guerra por...

A avaliação entre governistas para o imbróglio é pessimista. O Palácio do Planalto avalia que, nesta guerra por poder, independente da solução escolhida pelos deputados e senadores, o presidente Lula será o maior prejudicado. Isso porque, o governo nunca foi um grande entusiasta do retorno das comissões mistas. O Executivo tem pressa para aprovar MPs que estão para caducar e o rito apoiado pelos senadores é mais burocrático e oferece menor agilidade. Mesmo assim, os petistas acreditavam em uma solução interna dos congressistas para a encruzilhada. O estopim para que o governo entrasse no circuito ocorreu na última semana, quando Lira ameaçou sabotar o andamento das medidas na Câmara. ''O governo não queria colocar a digital dele nessa briga, mas sempre foi o maior interessado no assunto. Quando Lira subiu o tom, não teve jeito”, revela um aliado de Lula na Câmara.

O gesto de Lira foi interpretado entre aliados do governo como mais uma chamada pública para que Lula entrasse na... 

O gesto de Lira foi interpretado entre aliados do governo como mais uma chamada pública para que Lula entrasse na contenda. Na sexta-feira(24) o presidente da Câmara procurou o petista para uma conversa, oportunidade em que reiterou a ameaça de promover um ''apagão” do governo na Câmara. O recado foi mais um dentre vários outros que o deputado tem feito ao governo, colocando o Executivo em uma encruzilhada.
Ele acredita que, se o governo deseja conseguir mais apoio na Câmara, terá que fazer mais concessões, e o petista está ciente disso.
O jeito foi Lula articular para satisfazer o ímpeto de Lira, mas sem descontentar Rodrigo Pacheco, com quem tem estreitado as relações desde o início do governo. Das negociações, que contaram com a articulação do ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais), surgiram a possibilidade de se criar uma PEC para estabelecer um prazo para as comissões mistas e alterar o cálculo da composição dos colegiados. ''Esta não é uma pauta exclusiva de Lira, é algo que envolve líderes de todos os partidos. Todos querem que a Câmara não perca suas prerrogativas”, assegura um aliado de Lira à reportagem. Os liderados por Rodrigo Pacheco também não estão dispostos a ceder de Lira, que é conhecido no Senado como ''o imperador do Congresso”. O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou, após reunião com senadores, que há um entendimento de que as soluções propostas pela Câmara ''desequilibram o bicameralismo''.

''Esta não é uma pauta exclusiva de Lira, é algo que envolve líderes de todos os partidos. Todos querem que a Câmara não perca suas prerrogativas”, assegura um aliado de Lira à...
Cansados da teimosia de Lira e ciente de que o assunto está longe de ser pacificado, Lula está em busca de um plano B para contornar a crise e agora corre contra o tempo para evitar a caducidade de, ao menos, quatro das 13 medidas provisórias editadas pelo Planalto. Nas reuniões que teve com Lira e Pacheco, o presidente da República cobrou um compromisso de ambos para que avancem com a tramitação das MPs que regulamentam o Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida, a que trata da reestruturação da Esplanada dos Ministérios e a que promove a reoneração dos impostos federais sobre combustíveis. As demais, segundo Lula, devem ser transformadas em projetos de lei e, posteriormente, reenviadas ao Congresso, onde tramitarão em regime de urgência.

O Executivo tem pressa para aprovar MPs que estão para caducar e o rito apoiado pelos senadores é mais burocrático e...

As ameaças de Lira

O desgaste na relação de Lula com o presidente da Câmara é sintomático. Não são isoladas as reclamações governistas com a falta de gestos concretos do alagoano ao Planalto. É também de conhecimento do governo de que esta não será a última dificuldade criada pelo deputado ao Executivo. Há um histórico de ameaças de Lira, públicas e veladas, ao petista. Basta lembrar que, recentemente, o deputado alertou sobre a fragilidade da base governista no Parlamento – cobrança que vem na iminência de votação de projetos cruciais para agenda econômica do Planalto, como a âncora fiscal e a Reforma Tributária. Os alertas do deputado não são meros ''avisos amigos'' a Lula. O presidente da Câmara quer mais benesses para aliados políticos, em especial do Centrão. Ele acredita que, se o governo deseja conseguir mais apoio na Câmara, terá que fazer mais concessões, e o petista está ciente disso. Não à toa, acena com a liberação de emendas e sinaliza com a negociação de cargos de segundo e terceiro escalão da Esplanada dos Ministérios e que despertam o interesse do Centrão. O alagoano tem dito, ainda, que não está disposto a barrar a CPI do MST, com potencial para desgastar o PT.

 

VICTOR FUZEIRA

EDIÇÃO DE ANB

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