O Teatro de Ferreira Gullar ou um clandestino na primeira classe
Por Rossini Corrêa |
O
teatro, mais do que um lugar, constitui a reunião de três circunstâncias: a da
visão individual e coletiva, a do transcurso representado de uma narrativa e a
do impacto psicológico e emocional advindo da consumação do clímax expressivo.
Entre arquétipos e exemplaridades, que ressonante civilização passou à margem,
tangenciando-a como página em branco, da experiência, simultaneamente, real e
imaginária, contagiosa e eletrizante do teatro? Nenhuma. O gênio grego, por
exemplo, poderia ser definido sem o concurso necessário dos seus clássicos
autores teatrais, presentes na história da literatura universal? Jamais.
Refiro-me a Ésquilo e Agamenon e As Suplicantes; Sófocles e Antígona e Édipo, Rei; Eurípedes e Medeia e As
Troianas; Aristófanes e As Nuvens e Lisístrata; e, entre outros, Menandro e A
Tosqueada e O Arbitramento.
O
Brasil – ameaçado pela decadência sem ter alcançado a civilização, no vaticínio
do antropólogo e filósofo Claude Lévi-Straus – cedo madrugou, quando de sua
emergência tardia para a história escrita, no cultivo da arte teatral. José de
Anchieta foi estrategista do manejo da arte dramática junto aos indígenas, no
intuito de conquistar a sua consciência e reverter a sua cultura, trazendo-os e
ganhando-os para a cosmovisão do cristianismo, por meio da expressão teatral.
Chegaram até nós, da produção anchieteana, peças como Na Festa de São Lourenço,
Diálogo do Crisma, Auto da Guaraparim, Auto da Vila da Vitória e Auto na
Visitação de Santa Isabel. O apóstolo jesuíta, fundador, com Manuel da Nóbrega,
do Colégio de São Paulo de Piratininga, em cujo redor nasceu a cidade de São
Paulo, é reconhecido como a principal figura do quinhentismo, brasileiro, autor
da Arte de Gramática da Língua mais Usada na Costa do Brasil, pioneira no
estudo da língua tupi e dos poemas épicos e místicos, respectivamente, Os
Feitos de Mém de Sá e Poema em Louvor a Virgem Maria, fundacionais da poesia
brasileira.
É
consabido, entretanto, que a Independência do Brasil, em 7 de setembro de 1822,
ensejou um profundo ânimo autonomista na esfera da cultura, o qual logo
desembarcou na criação teatral, com Domingos José Gonçalves de Magalhães, autor
das tragédias Antônio José ou O Poeta e a Inquisição, Olgiato e Othelo, com as
quais Machado de Assis o reconheceu como, sobretudo, o fundador da dramaturgia
nacional – o que seria a sua glória maior. Todo um ciclo literário, de cunho
majoritariamente romântico, demarcou a sua eloquente presença no teatro
brasileiro, com Martins Pena, Gonçalves Dias, Manuel Antônio de Macedo, Álvares
de Azevedo, José de Alencar, Castro Alves e Casimiro de Abreu, em caminhada
que, com menor fortuna, alcançou Machado de Assis e sua dezena de peças
autorais.
Antônio
Gonçalves Dias, um dos fundadores do humanismo nacional brasileiro, na sua
refinada condição de polígrafo – poeta etnólogo, cronista, romancista,
historiador, dicionarista, epistológrafo, tradutor etc – foi teatrólogo de
extraordinária qualidade, conjugando capacidade criativa, superior consciência
técnica e domínio da dinâmica do enredo dramático. Autor de Leonor de Mendonça,
Patkull, Boabdill, Beatriz Cenci e da tradução de A Noiva de Messina, de
Friedrich Schiller, o poeta maranhense, como destaquei em Gonçalves Dias e
Ferreira Gullar: Destinos da Poesia Brasileira, recebeu o melhor reconhecimento
de Zgignieu Marian de Ziembnski e de Sábato Magaldi, aquele, a tê-lo como sólido
talento de dramaturgo, com substantivo conhecimento da conflituosidade no
teatro e este, a destacar Leonor de Mendonça como autêntica obraprima da
dramaturgia brasileira. Por sua vez, Marlene de Castro Correia sublinhou que o
teatro gonçalvino contribuiu para a descontinuidade do romantismo com o império
dos modelos clássicos do mundo antigo, privilegiando outros tempos, novos
espaços físicos e cênicos, luz e timbres locais e distintos quadros pitorescos,
alçando-os à condição de padrões estéticos peculiares e merecedores de
valorização. Frente à visão ligeira, lacunosa e claudicante, neste particular,
de Alfredo Bosi, ali iluminei o teatro gonçalvino como um momento complexo de
sua dialética artística, enraizada no particular e projetada no universal.
Alemanha, Itália, Portugal, Espanha e outros mundos constituem a ambiência da
dramaturgia gonçalvina.
Uma
constância foi firmada entre os poetas e os prosadores maranhenses projetados
no Brasil. Qual seja, a de, como Gonçalves Dias, prestarem devotados serviços à
arte teatral, tornando-se quer protagonistas, quer colaboradores do seu
desenvolvimento nacional. Quem poderá escrever a história da criação teatral no
Brasil sem a presença solar de Arthur Azevedo? O autor de A Capital Federal foi
poeta, contista e cronista, com a sua breve e fecunda existência, todavia,
dedicada à produção teatral, ora reunida em seis maciços volumes pela Fundação
Nacional de Artes–FUNARTE. Coelho Netto, prosador de A Conquista, foi cronista,
contista e romancista de profundo sucesso, até a Semana de Arte Moderna, porém,
garantiu presença na galeria dos clássicos do teatro brasileiro, com a sua obra
resgatada e reposta em circulação, em
dois robustos volumes, também pela Fundação Nacional de Artes–FUNARTE.
E
Graça Aranha – romancista de Canaã e de A Viagem Maravilhosa, memorialista de O
Meu Próprio Romance, filósofo de A Estética da Vida e ensaísta de Espírito
Moderno e Machado de Assis e Joaquim Nabuco – foi não apenas o diplomata e o
internacionalista, mas a força antagônica de Coelho Netto, em célebre sessão
disruptiva da Academia Brasileira de Letras. Homem de letras multimodal, por
mim retratado em Bacharel, Bacharéis: Graça Aranha, Discípulo de Tobias e
Companheiro de Nabuco, o artista maranhense foi o teatrólogo de Malazarte, a
confirmar uma vitoriosa tradição provincial, que remonta, em tempos de Estado
Autônomo, a Gonçalves Dias. E Viriato Corrêa, jornalista, mestre da história
romanceada, contista e cronista de extensa
bibliografia, foi teatrólogo e autor, como dramaturgo, de O Grande Amor de
Gonçalves Dias, obra-prima das letras nacionais. Assim como Machado de Assis, o
romancista, cronista, ensaísta e contista Josué Montelo, talvez com maior
fortuna, foi autor de, pelo menos, uma dezena de peças teatrais. E Odylo Costa,
filho, companheiro de geração de Josué Montello, e também acadêmico nacional,
foi poeta, cronista, contista, novelista e periodista de relevo, inclusive
político, sem deixar de ser autor de uma joia do teatro infantil, com Manuel
Bandeira como personagem, intitulada O Balão que Caiu no Mar.
Quanto
à Geração de 45 maranhense, reconfirmando uma consolidada tradição, também
estabeleceu uma conexão necessária com a criação teatral. A começar por
Bandeira Tribuzi, o qual, egresso de Coimbra, trouxe de Portugal para São Luís
toda uma literatura, particularmente, ibérica, de escassa circulação no Brasil.
Como é cediço, não me refiro ao manancial de criação poética e teatral advinda
do quinhentismo português e do Século de Ouro espanhol, até as conexões,
sobretudo francesas, com o Parnasianismo e o Simbolismo, no verso e com o
Naturalismo e o Realismo, na prosa. Estou falando, a bem da verdade, do
Modernismo português, de Fernando Pessoa e espanhol, de Federico Garcia Lorca,
ambos com vínculos com o teatro. O poeta português foi autor de O Marinheiro
(Drama Estático em um Quadro) e o bardo espanhol escreveu toda uma obra de
dramaturgo, do que são exemplos Yerma, Bodas de Sangue, A Casa de Bernarda
Alba, Dona Rosita a Solteira, e, entre outras, Mariana Pineda, O Malefício da
Mariposa e Tragicomédia de Don Cristobal.
Desta
maneira, os maranhenses da Geração de 45, retardatários em relação aos códigos
estéticos da Semana de Arte Moderna de 1922, se conectaram, primeiro, com o
Modernismo português, de Fernando Pessoa, Almada Negreiros, José Régio, Mário
de Sá-Carneiro, Miguel Torga e João Gaspar Simões e espanhol, de Federico
Garcia Lorca, Pedro Salinas, Vicente Aleixandre, Rafael Alberti e Luis Cernuda.
E Bandeira Tribuzi, poeta, ensaísta, novelista e cronista, segundo as vertentes
ibéricas de que era culturalmente originário, escreveu o precioso texto de
teatro poético, intitulado Rosamonde (O Touro da Morte), que permaneceu inédito
por décadas, mas foi por mim publicado, com prefácio do sociólogo pernambucano
Roberto Aguiar, sob a confiança de Dona Maria Tribuzi, o concurso de Maureli.
Costa e a decisão de Francisco Alves Camelo. Tratou-se da semente do heroico
esforço de publicação das obras completas tribuzianas, que tipografou também os
inéditos, Da Conveniência de Fazer-se um Deputado Conveniente, novela e
Tropicália (Consumo&dor), poemário.
Ferreira
Gullar, nos primórdios da década de 50, transferiu-se de São Luís para o Rio de
Janeiro, levando consigo a mudança do código estético, posto que transitara do
Centro Cultural Gonçalves Dias e da estreia em livro, com Um Pouco Acima do
Chão, para a edição, com Lago Burnett, da revista “Afluente” e a vitória, com o
poema “ O Galo”, no Concurso Nacional de Poesia, do “Jornal de Letras”, em
Comissão Julgadora formada por Manuel Bandeira, Odylo Costa, filho e Willy
Lewin. Ainda na primeira metade da década de 50, o jovem Gullar explodiria, em
combustão verbal estelar, para a história da poesia brasileira, com a
publicação de A Luta Corporal, livro de 1954, A produção teatral gullariana,
por sua vez, emergiria na década de 60, das mais agitadas do século XX
brasileiro, em meio ao frenesi político que levaria à ditadura militar de 31 de
março de 1964. É que o poeta maranhense, ao vir para Brasília em 1961, presidir
a sua Fundação Cultural, confrontaria o formalismo de vanguarda, com a
necessidade de responder aos clamores das classes populares candangas,
construtoras da nova Capital Federal, por usufruto cultural. Entre a Vida e a
Forma, ao retornar ao Rio de Janeiro, por meio de sua esposa Thereza Aragão,
aproximou-se Ferreira Gullar do Centro Popular de Cultura, da União Nacional
dos Estudantes-CPC/UNE, fato que o conduziria à criação do Grupo Opinião, com
Oduvaldo Viana Filho, Thereza Aragão, Pichin Pla, Denoy Oliveira, Paulo Pontes,
João das Neves e Armando Costa. Estavam definidos o contexto e o cenário da
primeira dentição da produção teatral gullariana.
Foi
desenvolvido por Ferreira Gullar um ciclo de parcerias com algumas das mais
ressonantes personalidades da dramaturgia brasileira no século XX, do que
resultaram as seguintes peças teatrais: com Oduvaldo Viana Filho, Se Correr o
Bicho Pega Se Ficar o Bicho Come; com Antônio Carlos Fontoura e Armando Costa,
A Saída? Onde Fica a Saída? e com Dias Gomes, Dr. Getúlio, sua Vida e sua
Glória, depois reintitulada para Vargas ou Dr Getúlio, sua Vida e sua Glória.
Quanto a Se Correr o Bicho Pega Se Ficar o Bicho Come, ao conjugar, como teatro
poético, as vivências plurais dos autores, girando em torno de terra, poder e
impasse brasileiro, permitiu a Ferreira Gullar trazer para o texto premiado com
o Saci e o Molière, o seu conhecimento da casta política do latifúndio
maranhense, em uma síntese perfeita com Oduvaldo Viana Filho, expressa nos três
finais: o feliz, o jurídico e o brasileiro
O
feliz:
“MOCINHA
Querido,
nasceu o nosso
décimo
terceiro filho,
grande
que parece um gato,
que
nome botamos nele, o de Roque ou de Honorato?
(Entra
Brás das Flores.)
BRÁS
DAS FLORES
Patrão,
tudo resolvido.
Expulsei
Zé Preto e Mano
que
eles venderam escondido
parte
da safra do ano”.
O
jurídico:
“ROQUE
(Diz
para Mocinha.)
Querida,
ouça: essas terras divido
com
os lavradores.
Não
quero ficar com a safra
e
a eles deixar as dores
(Entra
Brás das Flores de Juiz.)
Quem
é o Roque, o possesso?
Não
vai fazer o que pensa.
Me
acompanhe, por favor,
reabrimos
seu processo.”
O
brasileiro:
“MOCINHA
Ó,
Roque Jesus, Glicério
É
o novo Governador!
Na
recontagem de votos
foi-se
o Desembargador.
O
rádio também informa
Que
você será chamado
para
ajudar na Reforma
Agrária,
que vai dar terra a tudo que é lavrador.
(Brás
entra vestido de guerreiro medieval.)
Venho
da parte de sua
Majestade,
Sua Alteza
Dom
Requião, o Gentil,
Dizer
que foi restaurada
A
monarquia no Brasil.”
A
Saída? Onde Fica a Saída? por sua vez, enfrentou, em tempos de Guerra Fria e
mundo bipolar, dividido entre os Estados Unidos e a extinta União Soviética, o
angustiante problema da guerra nuclear, os interesses da indústria armamentista
e as exigências morais da defesa da paz, por meio da destruição dos artefatos
atômicos e da proibição global da construção de novas bombas. Na essência, a
temática em questão sobreviveu ao desmanche do mundo contraposto, pois o
ingresso no clube atômico – eis o Irã e a Coreia do Norte – permanece como a
aspiração deste ou daquele, vetada pelos Estados Unidos, cujo jogo de poder
fomenta guerras em favor da indústria armamentista e de sua fome pantagruélica
de mercado e de lucros, à sombra da morte, como acontece agora no conflito da
Ucrânia com a Rússia. Relativamente a Vargas ou Dr. Getúlio, sua Vida e a sua
Glória, permitiu o retorno ao teatro poético, girando à volta da pulsão vital
da quadra de uma escola de samba, cujo dramático enredo, com final gonçalvino, pretendia
homenagear Getúlio Vargas, homem de Estado suicida, ou suicidado, em 24 de
agosto de 1954:
“AUTOR
O
enredo termina aqui.
É
parte de nossa História,
que
eu, como povo, vivi.
A
verdade escrita em sangue
vira
mito na memória,
mas
tudo se deu assim,
isso
eu posso garantir,
porque,
meninos, eu vi”.
Trata-se
de texto teatral definitivo, já incorporado ao que de melhor produziu a
dramaturgia brasileira em todos os tempos. Descerrou-se, no tocante às décadas
de 70 e seguintes, a segunda dentição da produção teatral gullariana, à margem
das parcerias, com a produção de peças cem por cento autorais. Um Rubi no
Umbigo, por si só, com tudo quanto contém de crítica de costumes, consciência
das necessidades, denúncia das ambições e exposição da alienação humana,
girando em torno de tudo e de nada, “nesta batalha perdida/que todos têm que
vencer”, já garantiria a presença de Ferreira Gullar na galeria de honra da
dramaturgia brasileira.
Filósofo
da arte que caminhou para a antropologia filosófica, o pensador Gullar formulou
a teoria da vida como invenção, cada um como criador de si mesmo, traduzindo,
não sem ironia, o argumento no monólogo O Homem como Invenção de si Mesmo, no
qual o obsessivo e obcecado personagem Vincenzo busca convencer a todos da
justeza de sua tese, por meio de sua exposição, defesa, contraprova, reforma e
mais, mais e mais comunicação a outrem, levando os interlocutores ao desespero.
Em
Romance Nordestino, peça datada de 1983, retornou o escritor maranhense ao
teatro poético e à relação entre terra e poder, vivíssima em sociedades como a
brasileira, a qual embargou a democracia rural sonhada por Joaquim Nabuco e
conservou o trânsito do sistema de capitanias hereditárias para o modelo
sesmarial e deste, para a defesa do latifúndio, em parte sucedido pelo império
do agronegócio, mantendo a atualidade dos problemas da sociedade agrária,
deformando os caminhos da sociedade industrial e fraudando e frustrando as
passagens para a sociedade do conhecimento. É impagável a cena do Tribunal do
Júri:
“JUIZ
Vai
começar a sessão
para
que justiça se faça,
pra
que se puna o vilão
independente
de raça,
de
classe ou religião
que
lhe revista a carcaça.
JAGUNÇOS
Hoje
aqui vai ter desgraça!
JUIZ
(assustado)
Quero
dizer, a Justiça,
como
tudo, é relativa.
Não
pode ser implacável,
nem
cruel nem vingativa…
JAGUNÇOS
Agora
já melhorou!
PEDRO
Mas
justa terá de ser
ou
não é Justiça, não!
JUIZ
Não
dê palpite, senão...
É
Justiça, sim, senhor,
mas
Justiça do sertão,
Justiça
do interior,
levando
em conta
o
caráter próprio desta região…
POVO
É
uma esculhambação!
JUIZ
Pode
falar, promotor,
dê
início à acusação
PROMOTOR
O
coronel João-sem-Terra
é
o mandante do crime.
ADVOGADO
Protesto!
A prova dos autos de toda culpa o exime.
Um
homem de tantas posses
jamais
vai cometer crime!
PROMOTOR
Ele
provocou a morte
de
quatro trabalhadores
ADVOGADO
Desculpe,
menos verdade!
Eram
de fato invasores.
Pior
que isso: infratores
da
lei da propriedade.
E
além do mais, não morreram.
PROMOTOR
Quem
disse que não morreram?
ADVOGADO
Ninguém
pode provar isso.
Sem
cadáver não há crime
E
onde estão os cadáveres?
PROMOTOR
O
coronel deu sumiço!
ADVOGADO
Ou
os quatro se esconderam só pra criar rebuliço?
Só
para manchar a honra
de
um homem probo, inteiriço,
como
o coronel João
que,
na modéstia que encerra,
se
intitula humildemente
de
coronel João-sem-Terra?
PEDRO
Tem
mais terra que um barão!
PROMOTOR
Aí
está o Dadeco,
que
a mando dele matou!
ADVOGADO
Dadeco
nem atirou.
Seu
rifle não tinha bala.
Isso
ficou comprovado
pelo
perito Cegonha
conforme
o laudo assinado.
(Mostra
o laudo.)
POVO
É
uma pouca vergonha!
JUIZ
Mando
evacuar a sala!…
Vou
dar minha decisão.
Seja
qual for a pressão,
a
Justiça não se abala…
Quatro
pessoas morreram,
É
fato sem discussão.
JAGUNÇOS
Pra
morrer cinco não custa!
JUIZ
(assustado)
A
justiça não se assusta!…
Se
os corpos não aparecerem,
não
procede a acusação.
Ponho
os réus em liberdade.
Tá
encerrada a sessão.
(Bate
o martelo e se levanta para sair.)
POVO
Esse
juiz é venal!
Não
é juiz, é palhaço!
JUIZ
Olha
que eu saio no braço!
JAGUNÇOS
(Apontando
às armas contra o povo.)
Nós
saímos no balaço.
POVO
(Vaiando.)
É
um palhaço! Palhaço!
(O
juiz se volta e dá uma banana.)
JOÃO-SEM-TERRA
Chega!
Isto é um tribunal!
É
mais sagrado que missa.
Um
juiz não é palhaço.
Aonde
iremos parar
desrespeitando
a Justiça?
(ao
juiz)
Mande-me
lá um abraço!
JUIZ
(Se
deixa abraçar constrangido)
Me
digam: o que que eu faço?!”
Como
se se tirasse por menos, Ferreira Gullar dizia não ser isto ou aquilo, apenas,
modéstia à parte, poeta, quando, na verdade, foi poeta, cronista, ensaísta,
ficcionista, artista visual, memorialista, tradutor e filósofo da arte e da
cultura. E dramaturgo. Dos mais significativos de todos os tempos brasileiros.
Na galeria em que estão, no século XX, entre outros, Ariano Suassuna, Nélson
Rodrigues, Dias Gomes, Oduvaldo Viana Filho, Chico Buarque, Plínio Marcos,
Paulo Pontes, Augusto Boal, Jorge Andrade, Gianfrancesco Guarnieri e Miguel
Falabela, se encontra, destacadamente, o polígrafo maranhense, senhor de
valorosa obra teatral. Confessou o pluriartista Gullar que deixava inéditas,
pelo menos, duas peças de teatro, versando sobre a queda de Salvador Allende,
no Chile e a sua prisão na Vila Militar, no Rio de Janeiro. Integram o ouro em
pó pertencente a seus herdeiros, Luciana de Aragão Ferreira (Gullar) e Paulo de
Aragão Ferreira (Gullar), bem como à cultura brasileira, sob a curadoria de
Celeste de Aragão Ferreira (Gullar) Alves, aqueles, filhos e esta, neta, no
templo da Rua Duvivier, nº 149, Copacabana, Rio de Janeiro, Brasil, onde
aguardam o chamado da publicidade e da eternidade, peças teatrais, diários,
livros infantis, entrevistas, dispersos, fotografias etc, etc,
etc.
Rossini
Corrêa é um dos mais brilhantes intelectuais do Maranhão. Advogado, Escritor e
Filósofo do Direito, com mais de 38 livros publicados, entre os quais se
destacam: Saber DireitoTratado de Filosofia Jurídica; Jusfilosofia de Deus;
Crítica da Razão Legal; Bacharel, Bacharéis: Graça Aranha, discípulo de Tobias
e companheiro de Nabuco; Teoria da Justiça no Antigo Testamento; José Américo,
o Jurista; Política Externa Independente: contribuição crítica à história da
diplomacia nacional; O Liberalismo no Brasil: José Américo em perspectiva;
Brasil Essencial: para conhecer o país em cinco minutos; O Bloco Bolivariano e
a Globalização da Solidariedade: bases para um contrato social universalista; e
Romeu e Julieta no Brasil.
Pertence
à Academia Brasiliense de Letras–ABL, à Academia Maranhense de Letras–AML, à
Academia Internacional de Cultura–AIC e ao Instituto Histórico e Geográfico do
Distrito Federal–IHGDF.
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