domingo, 10 de junho de 2018
No México
Relatório diz que não há uma linha de investigação sobre participação de agentes do estado na morte dos 43 em Ayotzinapa
Quase quatro anos depois do desaparecimento de 43 estudantes em
Ayotzinapa, no México, em setembro de 2014, a Comissão Interamericana de
Direitos Humanos (CIDH) criticou hoje (6) a investigação da
Procuradoria-Geral da República mexicana sobre o caso. Segundo a
comissão, houve "graves irregularidades", como omissão na investigação
de agentes públicos, além da adoção, pelo Estado mexicano, de uma versão
não "aprofundada" sobre desaparecimento dos jovens.
A conclusão é parte de um relatório apresentado nesta quarta-feira sobre o trabalho, o chamado Mecanismo Especial de Acompanhamento Assunto Ayotzinapa,
um grupo criado pela CIDH há dois anos para acompanhar o andamento das
investigações. "A Comissão conclui que persistem sérios desafios e
obstáculos que devem ser superados para alcançar a verdade, a justiça e a
reparação", diz o texto.
A CIDH observou qu,e nas investigações coordenadas pela Procuradoria do
México, não há "uma linha de investigação que esteja apurando um suposto
envolvimento do Exército, da Polícia Federal e da municipal,
autoridades estaduais e funcionários do governo - por ação ou omissão no
desaparecimento forçado dos jovens, ocorrido entre 26 e 27 de Setembro
de 2014”.
Versão contestada
Segundo o documento, a tese do governo de que os estudantes haviam sido assassinados e incinerados não encerra o caso. Primeiro, porque não houve investigações a fundo para verificar envolvimento de agentes públicos, segundo, porque os argumentos usados pelo estado carecem de mais "profundidade".
O mecanismo de investigação da CIDH para o caso pediu que as autoridades mexicanas mudem a narrativa das investigações. |
O mecanismo de investigação da CIDH para o caso pediu que as autoridades
mexicanas mudem a narrativa das investigações, para seguir novas linhas
na apuração do caso.
A Corte Interamericana já havia
ordenado a criação de uma comissão de investigação da verdade e da
justiça, composta de representantes das vítimas, da Comissão Nacional de
Direitos Humanos e do Ministério Público da Federação.
Parentes
dos estudantes acusam o sistema judicial mexicano de direcionar as
investigações para "ocultar" o possível envolvimento de agentes da
Polícia Federal, do Exército e até mesmo nos níveis do Executivo. A CDIH
considera a versão apresentada pela Procuradoria-Geral mexicana "pouco
credível e mantida à custa de ignorar os fatos".
A CDIH enfatizou ainda que as investigações da PGR permanecem
"fragmentadas" e que diferentes pesquisas não foram integradas para que
se chegasse àa verdade sobre o caso. Além disso, há investigações
incompletas sobre a polícia federal, o Exército e a polícia local. O
relatório cobra ainda do governo mexicano adequada assistência às
famílias das vítimas.
O caso
Na
noite de 26 de setembro de 2014, estudantes de uma escola rural de
Ayotzinapa deslocavam-se em um ônibus, da escola à cidade de Iguala,
estado de Guerreiro, Sul do México. Eles haviam sequestrado o ônibus,
uma prática comum entre os estudantes da zona rural mexicana e na
escola, conhecida por sua ideologia de esquerda.
Os estudantes, em sua maioria, calouros,
embarcaram no ônibus e participaram do "sequestro" para arrecadar fundos
e tentar usar o veículo em um protesto que seria realizado na cidade do
México, em outubro.
Segundo as investigações, o ônibus
foi parado por policiais militares do munícipio de Iguala. Três
estudantes foram assassinados após disparos da polícia contra o ônibus. O
veículo foi então conduzido pela polícia, e os estudantes que estavam
dentro do ônibus desapareceram.
A versão da Procuradoria é
de que eles foram entregues pelos policiais municipais ao cartel do
narcotráfico Guerreros Unidos, que os teria matado e incinerado os
corpos. Esta versão foi rejeitada porque não há evidência de que um fogo
intenso (para queima de 43 corpos) tenha sido usado na região apontada.
Somente um corpo foi identificado, o de Alexander Mora, em um rio.
Segundo
a versão oficial, o ex-prefeito de Iguala, José Luís Abarca, ordenou o
ataque porque temia que os estudantes causassem distúrbios durante um
discurso de sua esposa. Os estudantes teriam sido confundidos pelo
cartel Guerreros Unidos com Los Rojos, uma facção rival do grupo.
As
investigações mostraram que o ônibus sequestrado transportava heroína e
não foi possível determinar se os estudantes sabiam da existência da
droga, nem há investigações suficientes sobre a relação entre a polícia
militar, que parou o ônibus e integrantes de carteis de drogas.
As informações são da repórter Leandra Felipe
Edição de Nádia Franco
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