Encontro histórico marca primeira visita de um presidente
norte-coreano ao país vizinho
Nesta
sexta-feira (27), os líderes das Coreias do Sul e do Norte se reunirão na localidade fronteiriça de
Panmunjeom, marcando a primeira vez que um mandatário do norte
atravessará a Zona Desmilitarizada (ZDC) que divide as duas nações. Dois presidentes sul-coreanos – Kim Dae-jung e Roh Moon-hyn – já haviam realizado encontros com Kim Jong-il, pai do atual comandante
norte-coreano, em 2000 e 2007, respectivamente, mas não chegaram a grandes transformações na condução das tensões entre os dois países.
É importante
registrar que não existe tratado de paz entre as duas Coreias,
em uma guerra que está em cessar-fogo desde
1953 (para entender melhor a crise na península coreana,
leia o dossiê da Tricontinental em inglês ou espanhol).
O fim do conflito foi discutido nas reuniões de cúpula ocorridas em 2000 e 2007, mas não avançou muito. Há expectativa de que a questão volte à pauta neste novo encontro, o que confere grande relevância para a viagem de Kim Jong-un a Panmunjeon.
Política do Sol
Outro fato
importante é que, logo após a posse do presidente sul-coreano Moon
Jae-in, o país vizinho fez um teste com mísseis balísticos. Mesmo assim, o novo mandatário anunciou,
para compor seu governo, dois nomes importantes na longa história de tentativas de melhorar o relacionamento entre as duas Coreias – o primeiro-ministro Lee Nak-yeon e o chefe da
Inteligência Suh Hoon –, apesar da pressão dos Estados Unidos, do Japão e de parte dos poderes de seu próprio país para evitar a chamada ‘Política do Sol’ de reaproximação das duas nações.
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Panmunjeom, local onde os líderes das duas Coreias se reunirão. / Corpo de Imprensa da Cúpula Intercoreana. |
O governo da
Coreia do Norte continuou com o que parecia um cronograma beligerante de testes
com mísseis e armas nucleares. Com a reação ruidosa e
belicosa do presidente dos EUA, Donald Trump, parecia de fato que a guerra se
colocava como uma realidade no horizonte da península do
Oriente. Mas o que os estadunidenses não calculavam é que os norte-coreanos estavam menos interessados no conflito e mais
investidos em garantir uma boa posição de negociação quando se reunissem com o vizinho do sul.
Guarda-chuva
nuclear
Foi
inteligente a decisão norte-coreana de anunciar, na semana
passada, que interromperia os testes nucleares em Punggye-ri. A medida fez
parecer que o país tinha intenções sérias de acabar com a tensão nuclear na
região, mesmo que o gesto, na verdade, tenha acontecido em novembro – mas ninguém estava
prestando atenção. O local em si já estava deteriorado e seria
pouco provável que se pudesse conduzir testes ali no futuro. Ainda assim, a ação produziu o efeito esperado: mostrou ao mundo que a Coreia do Norte
está disposta a fazer concessões no âmbito nuclear.
Como dizem os
diplomatas norte-coreanos, na verdade, o país não está disposto a entregar seu arsenal nuclear. Eles citam o caso da Líbia, onde o líder Muammar Qaddafi abriu mão de seu
programa nuclear e viu o país ser destruído por uma guerra promovida pela Organização do Tratado do
Atlântico Norte (Otan). Já a Coreia do Norte não está disposta a acreditar na palavra dos Estados Unidos, entendendo, nas
declarações de Trump sobre o acordo com o Irã, que não é possível confiar em um aperto de mãos com
Washington. Mais provável que a desnuclearização é a possibilidade de as
duas Coreias
transformarem o armistício de 1953 em um acordo de paz e aumentarem o
nível de cooperação para além da ZDC.
Poderio
estadunidense
Mas seria um
tratado de paz entre a Coreia do Sul e do Norte suficiente? Afinal, uma das
partes beligerantes da situação são os EUA. Foram eles que participaram da guerra entre 1950 e 1953. São bases estadunidenses com cerca de 35 mil soldados que abarrotam a
Coreia do Sul, enquanto outros 40 mil estão no Japão. Navios e aeronaves de guerra com capacidade nuclear estão constantemente atravessando os mares e o ar próximo dos norte-coreanos. Se o país sob comando
de Trump decidir não participar do fim da guerra, a guerra não acabará de verdade. Esse é um problema sério para Moon Jae-in, pois o líder sul-coreano não pode assinar o tratado em nome dos Estados
Unidos.
A ministra das
Relações Exteriores da Coreia do Sul, Kang Kyung-wha, reuniu-se com Susan
Thornton, nomeada por Trump para o Departamento de Estado para Ásia Oriental e Pacífico. Lee Do-hoon, da
divisão intercoreana de negociações de paz,
reuniu-se com Kanasugi Kenji, do Ministério de Relações Exteriores do Japão. Os dois encontros
tiveram o objetivo de garantir aos estadunidenses e japoneses que os
sul-coreanos veem o diálogo como parte de um processo que não deve ser prejudicado. Talvez não saia nada de
espetacular e significativo da reunião desta sexta,
mas ela deve, mesmo assim, ser considerada significativa pelo simples fato de
ocorrer.
As informações são do repórter Vijay Prashad
Tradução de Aline Scátola
Edição de Fernando Atallaia
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