segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018
17:50
| Postado por
Equipe Baluarte
|
De acordo com
pesquisa do IBGE, o número de pessoas na informalidade cresceu em mais de 500
mil no último ano
Ao subir a rampa de entrada da estação de
metrô Barra Funda, na zona oeste de São Paulo, o passageiro se sente em uma
feira livre, passando por um túnel de ambulantes gritando promoções de uma
grande variedade de produtos. De fones de ouvidos, chinelos de dedo, até
diferentes marcas de doces, o fenômeno, conhecido como
"shopping-trem", vem crescendo cada vez mais, principalmente dentro dos
próprios vagões do metrô e da CPTM na cidade.
É o caso do vendedor ambulante de balas e
chocolates Alexsander de Souza, de 40 anos, que já está no ramo há quatro anos,
mas vê, a cada dia, a concorrência aumentar. Ele conta que, além das vendas,
continua tentando arranjar um emprego formal, mas está pessimista.
"Já trabalhei um mês com carteira
assinada, como ajudante geral. Mas está cada vez mais complicado achar
emprego com carteira assinada, sem dúvida. Cada vez mais está aumentando o
número de ambulantes. Tem um colega meu que era médico antigamente, há dois
anos, hoje em dia ele é vendedor ambulante", contou.
A situação dos ambulantes no transporte
público de São Paulo reflete os dados divulgados nesta semana pela Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE). De acordo com a pesquisa, o trabalho informal representou
grande parte dos empregos gerados no país em 2017.
De 1,846 milhão de postos de trabalho gerados
no último trimestre do ano passado, 589 mil vagas surgiram no setor privado sem
carteira de trabalho assinada. A esse número, somam-se 1,07 milhão de pessoas
que passaram a atuar como trabalhadores autônomos.
Rampa da Estação Barra Funda do Metrô, em São Paulo, tomada por produtos de vendedores ambulantes. |
Esse número é preenchido, por
exemplo, por um grupo relativamente novo no mercado: os motoristas de
aplicativo. Segundo a empresa Uber, já são 500 mil motoristas contabilizados no
país. Embora parte dos motoristas de aplicativo utilizem o serviço como
complemento de outra renda fixa, um grupo significativo deles são representados
por pessoas que perderam seus empregos nos últimos anos.
O motorista Alexsandro Costa Damaceno, que
vive em Alagoinhas, no interior da Bahia, trabalha por meio do aplicativo de
celular há sete meses. Técnico em eletrônica industrial, ele prestou serviço para
a Petrobras por 14 anos, mas com a crise política e econômica no país, teve seu
contrato encerrado em maio do ano passado.
"A gente que tem filho não pode se dar ao
luxo de ficar parado, tem que ter uma renda no final do mês, até mesmo porque
as contas não esperam. Eu fico triste porque a gente investe tanto, tem curso
técnico, se qualifica, e hoje todo mundo parado", lamentou.
Maquiagem
Os dados da PNAD mostram também que o número
de pessoas inseridas no mercado de trabalho com carteira de trabalho assinada
encolheu em 2%, o que representa um total de 685 mil pessoas. Apesar do quadro
negativo, o governo golpista de Michel Temer vem anunciando com otimismo a
queda no desemprego do país, que terminou o ano em 11,8%.
Para a economista e pesquisadora do Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Adriana
Marcolino, o crescimento do trabalho informal está sendo usado pelo governo
para maquiar os impactos da crise econômica no país.
"Vi o governo divulgando esse dado como
se fosse positivo, como se fossem pessoas indo empreender. Mas na verdade os
trabalhadores por conta própria são pessoas que não veem oportunidades de
emprego. Se a gente olha com cuidado para os dados e vê que tipo de
emprego está sendo gerado. São empregos que você tem menos acesso a
benefícios e proteção social, benefícios que compõem a renda também",
explicou.
O motorista Alexsandro opina que não tem
sentido o crescimento econômico divulgado pelo governo, e que sente falta de
ter seu registro na carteira. "Temer está abrindo a boca e dizendo
que tudo está melhorando, eu não estou vendo isso, meus colegas continuam todos
parados", relatou.
Precarização
A jovem Karen de Macedo, moradora do Jardim
Eliane, na zona leste de São Paulo, começou em um novo emprego na semana
passada, na cantina de uma escola estadual no bairro do Butantã. Antes
desempregada, após trabalhar informalmente por meses em um posto de gasolina,
ela conta que o atual emprego também não será registrado na carteira de
trabalho, e sim por meio do que ela chama de "contrato de boca".
"Está quase impossível, ninguém está
querendo registrar mais. Mas a gente acaba aceitando por necessidade, né, eu
tenho um filho de oito anos para criar. É complicado, todo mundo fica
inseguro, se você sofre um acidente você não tem o recurso de ficar tranquila
porque vai ter um dinheiro para pagar as contas e alimentar a família. Você
também acaba aceitando horários exorbitantes. No posto de gasolina eu não
tinha horário, tinha dia que entrava às 6 da manhã, saía às 14h, voltava às 18h
e saía às 3h da manhã. Não tem horário para se alimentar, porque não tem
uma hora de almoço garantida", denunciou.
Ao longo dos seus 26 anos, Karen já trabalhou
em diversos lugares, mas apenas dois deles a registraram. Acostumada, ela explica
que pretende começar um curso de pedagogia a partir do segundo semestre deste
ano, na expectativa de seguir o sonho de ser professora e conseguir escapar da
informalidade. O diploma universitário, no entanto, não tem sido a garantia de
um emprego formal para muitos jovens.
É o caso da jornalista Carolina Ellmann, que
se formou no fim de 2017, e já vinha procurando emprego ao longo do ano, também
na capital paulista. Na falta de vagas que cumprem os direitos trabalhistas,
ela vem juntando dinheiro por meio da venda de cosméticos e terapias naturais.
"Eu encontro vagas absurdas que estão me
fazendo desistir de procurar trabalho na área do jornalismo. Nenhuma vaga é CLT
que eu encontrei e todas tem salário de R$400 reais para trabalhar 6, 8 horas,
ou um salário de R$1.000, igual o que eu ganhava quando estagiava, para
trabalhar "até o trabalho acabar"", afirmou.
Reforma Trabalhista
Com as novas regras da Consolidação das Leis
Trabalhistas (CLT), que entraram em vigor em novembro do ano passado, a expectativa
é que as vagas de trabalho precarizadas aumentem ainda mais. É o que opina a
pesquisadora do Dieese.
"A reforma trabalhista primeiro deixa o
trabalhador mais vulnerável, porque o empregador ganhou mais poder nas relações
de trabalho, e por outro lado você criou uma série de contratos de trabalho que
maquiam situações precárias no mercado de trabalho, como o trabalho
intermitente, que você contrata uma pessoa em uma situação praticamente de
bico", afirmou.
Desde o início de vigência da nova lei,
em novembro do ano passado, mais de 3 mil postos de trabalho intermitente
foram gerados. Em dezembro, foram mais de 2.500 admissões por meio desse tipo
de contrato.
As informações são da repórter Júlia Dolce
Edição de Camila Salmazio
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