sábado, 11 de novembro de 2017
Reforma trabalhista entra em vigor em meio a polêmicas sobre precarização
Saiba quais são as principais mudanças na legislação.
As novas regras da legislação trabalhista entraram em vigor neste sábado (11), em meio a críticas sobre a possibilidade de precarização das condições de trabalho e retrocesso nos direitos conquistados ao longo dos anos pelo trabalhador. As mudanças dividem a opinião de especialistas, entre os que defendem a flexibilização das relações de trabalho, e os que acreditam que a nova lei, além de prejudicial, fere direitos constitucionais.A reforma trabalhista foi aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente Michel Temer (PMDB) no último dia 13 de julho. Ela altera uma série de normas previstas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e destaca a prevalência do negociado sobre o legislado – pontos que poderão ser negociados entre empregadores e empregados e, em caso de acordo coletivo, passarão a ter força de lei.
Especialistas alertam que empregados e empresas devem ficar atentos às alterações que virão nos novos contratos assinados a partir deste sábado. O advogado Ruslan Stuchi, sócio do escritório Stuchi Advogados, afirma que as novas regras certamente trarão alterações significativas em um primeiro momento no cenário brasileiro.
“Ela está consubstanciada em uma pressão da classe empresarial que busca uma flexibilização no slogan de que só será possível um crescimento econômico empresarial com a referida reforma”, acrescentou.
Apesar de empresas e trabalhadores já estarem cientes das mudanças desde julho, os efeitos serão sentidos nos próximos meses, no cotidiano da relação. O artigo 7º da CLT, entretanto, se manteve inalterado, mantendo direitos basilares dos trabalhadores, tais como a proteção de despedida arbitrária, seguro desemprego, fundo de garantia, salário mínimo legal, irredutibilidade salarial, décimo terceiro salário, salário família, gozo de férias, licenças e aposentadoria.
Contudo, outros pontos da nova lei poderão ser colocados em prática de imediato a partir do dia 11: o período que o empregado gasta no trajeto de casa até o trabalho, por exemplo, não será mais computado na jornada.
O texto prevê que a negociação
entre empresas e trabalhadores prevalecerá sobre a lei.
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Essas mudanças afetam o cotidiano das relações trabalhistas, pois além de alterar pontos essenciais das rotinas de trabalho, implanta e regulamenta novas modalidades, como o trabalho remoto (home office) e o trabalho intermitente.
"Dito de outro modo", disse a vice-presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, desembargadora Rosana Salim Villela Travesedo, continuando, "o Judiciário intervirá menos na negociação coletiva, prevalecendo a autonomia da vontade".
Outra novidade é a possibilidade de a gestante trabalhar em ambientes insalubres, o fim da obrigatoriedade do imposto sindical, quitação anual do contrato de trabalho, dentre outras alterações.
Na avaliação de Fabio Chong, sócio da área trabalhista do L.O. Baptista Advogados “a nova legislação procura retirar a lei do papel de protagonista nas relações trabalhistas oferecendo esse papel aos empregados e empregadores, e ao mesmo tempo, limita o chamado ativismo judicial da Justiça do Trabalho, restringindo o poder dos Juízes de, por exemplo, rever o conteúdo das normas coletivas e de criar súmulas”.
Crise e novas modalidades
O presidente Michel Temer vem afirmando que, com as novas regras, haverá um crescimento da economia e geração de empregos. A crise, segundo o peemedebista, será aplacada. As Reformas, tanto Trabalhista como Previdenciária, são as principais bandeiras do seu governo.
"Oxalá se concretize essa previsão", disse a desembargadora Villela. "Ajuda a reduzir a alta de desemprego? Mas como ficará a questão de segurança do trabalhador?", completou.
O advogado Ruslan Stuchi, acredita que, em um momento rápido e atual, a reforma não terá força de mudar o cenário de desemprego que assola o país. “Sua aplicação começara de maneira discreta e tímida, principalmente pelas pequenas e médias empresas”, disse o especialista.
Já o advogado, doutor em Direito do Trabalho e professor da pós-graduação da PUC-SP, Ricardo Pereira de Freitas Guimarães afirma que haverá a criação de subempregos, “longe das previsões de respeito à dignidade do ser humano”, acrescentou.
“Contratos de empregos hoje existentes serão transformados em outras formas de prestação de serviços mais precárias. Nessa linha, não haverá real redução do desemprego. Algumas formas de trabalho, como o teletrabalho, seja em razão do local de prestação de serviços, seja pela dificuldade da realização de visitas da fiscalização dessa forma de trabalho, ficarão realmente sem a segurança que se espera”, exemplificou.
Os novos perfis do trabalhador (intermitente e teletrabalho), segundo ele, encontram fundamento na diminuição de alguns direitos e redução do poder de compra dos empregados. “Um declínio nas relações de emprego”, disse.
Além disso, o especialista afirma que haverá impactos em questões sociais, “como o não reconhecimento da função social do trabalho, elevação de cargas horárias, supressão de intervalos, ou seja, uma infinidade de violações”, criticou Guimarães.
“O governo vem difundindo a ideia de que a Reforma irá criar muitos postos de trabalho e reduzir o desemprego. No entanto, parece-nos que as circunstâncias capazes de reduzir o desemprego estão mais ligadas fatores econômicos, totalmente distintos e desvinculados da nova legislação. Via de regra, não se cria postos de trabalho a partir da publicação de uma nova lei”, destacou Fabio Chong.
Para Chong, regras do trabalho intermitente, por exemplo, abrem a possibilidade para que o indivíduo arrume emprego, porém, sem qualquer garantia de rendimento, já que a remuneração está ligada, neste caso, a demanda do empregador. “Assim, como não há limite temporal algum, pode ocorrer de um empregado permanecer na folha de pagamento de uma empresa por anos sem nunca ter recebido qualquer remuneração”, alertou o especialista, finalizando: “Verifica-se, assim, que o desemprego pode até diminuir ao longo dos anos, mas isso não significa que renda do trabalhador irá aumentar”.
O defensor público do Estado do Espírito Santo, Carlos Eduardo Rios do Amaral, foi além, e disse que "essa precarização das relações vai chegar na defensoria como uma tragédia".
"Na atual legislação, o salário mínimo é o mínimo que o trabalhador ganha como empregado. A questão agora será saber como ficarão as pensões alimentícias de filhos menores, com a figura do autônomo exclusivo contínuo, afastando a qualidade de empregado do trabalhador. Quem será esse novo devedor de alimentos aos filhos menores nas Varas de Família?", questionou Carlos respondendo em seguida:
"Primeiramente, será aquele devedor sem a garantia constitucional do salário-mínimo como fonte da própria subsistência. Por segundo, será aquele demandado sem folha de pagamento para se operar os descontos da pensão alimentícia determinados pela Justiça. E ainda, os Juízes de Direito das Varas de Família não poderão exigir do devedor que sua remuneração como autônomo exclusivo contínuo seja igual ou superior ao valor de um salário-mínimo, para garantia da dignidade da criança credora", disse.
"Com isso, eu questiono: essa proposta não retira, de fato, direitos constitucionais trabalhistas? Eu faço 10 divórcios por dia. Então você imagina a tragédia", concluiu.
Rosana Villela respondeu: "Essa Reforma representa verdadeiro retrocesso, na medida em que rui um dos pilares do Direito do Trabalho: a proteção ao trabalhador, hipossuficiente na relação com o capital. Em momentos de crise, a flexibilização de direitos só favorece a expansão do capitalismo predatório, em que os grandes engolem os pequenos".
Pontos importantes da nova lei trabalhista:
- Direitos garantidos: Não podem ser alterados e nem negociados os direitos relativos ao pagamento do FGTS, o recebimento do salário-mínimo e 13º salário, seguro-desemprego, repouso semanal remunerado e as normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho, além das regras sobre a aposentadoria, salário-família, licença-maternidade com a duração mínima de cento e vinte dias, licença-paternidade, entre outras.
- Férias: Continua sendo de 30 dias anuais; entretanto, se houver acordo entre patrões e empregados, pode ser dividida em até três vezes, desde que um dos períodos seja de 14 dias corridos e, os demais, cinco dias corridos.
- Tempo de percurso no transporte e horas trabalhadas: Pela Reforma Trabalhista, o tempo gasto pelo empregado no percurso para se chegar ao local de trabalho ou no retorno para casa não poderá mais ser computado como parte da jornada de trabalho, independentemente do meio de transporte usado, mesmo o local de trabalho sendo de difícil acesso.
- Intervalo de almoço: O intervalo dentro da jornada de trabalho poderá ser negociado, desde que tenha pelo menos 30 minutos. Se o empregador não conceder intervalo mínimo para almoço ou for parcial, a indenização será de 50% do valor da hora normal de trabalho apenas sobre o tempo não concedido em vez de todo o tempo de intervalo devido.
- Contribuição sindical: A contribuição sindical não será mais obrigatória. Agora, o pagamento será opcional.
- Registro em Carteira de Trabalho: A nova regra prevê o aumento da multa por empregado não registrado pelo patrão para R$ 3 mil. Nos casos de microempresa e empresa de pequeno porte a multa será de R$ 800 por funcionário.
- Ações na Justiça: A nova lei altera algumas regras para o ingresso de ação na Justiça do Trabalho. Por exemplo, limita valor a ser pleiteado pelo trabalhador, estabelecendo teto para alguns pedidos de indenização. Ofensas graves cometidas por empregadores devem ser de, no máximo, 50 vezes o último salário contratual de quem foi ofendido. O trabalhador tembém poderá ter que indenizar a empresa em caso de pedidos de má-fé ou negados pelo Judiciário.
- Demissão consensual: Trabalhadores e empresas poderão optar pela demissão em comum acordo. Por esse novo mecanismo, a multa de 40% do FGTS será reduzida para apenas 20%, e o aviso prévio ficará restrito a 15 dias. Além disso, o trabalhador pode sacar somente 80% do Fundo de Garantia, mas perde o direito de receber o seguro-desemprego.
As informações são da repórter Rebeca Letieri
Edição de Fernando Atallaia
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