quarta-feira, 7 de junho de 2017
Regularização fundiária
Rua 1, beco 10, casa 55: o
Brasil dos que não têm endereço postal
Com mais de 11 milhões de
pessoas em favelas, país tropeça na regularização fundiária. Faltam dados
oficiais sobre população sem títulos de propriedade
Maria dos Reis, de 57 anos, vive no Vidigal, uma favela do Rio de Janeiro que sobe pelas encostas de um morro de mais de 500 metros de altitude. Sua casa tem dois andares e uma varanda, três quartos pequenos e dois banheiros e de suas janelas corrediças se vê o mar que banha a praia de Ipanema e Leblon, o bairro com o metro quadrado mais caro da América Latina. Comprada há 17 anos, quando chegou ao Rio vinda do interior do Brasil, Maria conseguiu ser proprietária oficial dessa modesta joia em que hoje vive com seu marido, sua irmã, sua filha e seus três netos, há somente três anos. Foi numa das diversas campanhas que autoridades de todas as esferas – estatal, municipal e federal –, fazem de vez em quando para regularizar a precariedade, sem acabar com ela. Enquanto Maria tem seu registro oficial, muitos de seus vizinhos, a apenas 200 metros de distância, vivem à espera de um documento que os transforme em donos de suas casas, construídas com suas próprias mãos.
Maria dos Reis, de 57 anos, vive no Vidigal, uma favela do Rio de Janeiro que sobe pelas encostas de um morro de mais de 500 metros de altitude. Sua casa tem dois andares e uma varanda, três quartos pequenos e dois banheiros e de suas janelas corrediças se vê o mar que banha a praia de Ipanema e Leblon, o bairro com o metro quadrado mais caro da América Latina. Comprada há 17 anos, quando chegou ao Rio vinda do interior do Brasil, Maria conseguiu ser proprietária oficial dessa modesta joia em que hoje vive com seu marido, sua irmã, sua filha e seus três netos, há somente três anos. Foi numa das diversas campanhas que autoridades de todas as esferas – estatal, municipal e federal –, fazem de vez em quando para regularizar a precariedade, sem acabar com ela. Enquanto Maria tem seu registro oficial, muitos de seus vizinhos, a apenas 200 metros de distância, vivem à espera de um documento que os transforme em donos de suas casas, construídas com suas próprias mãos.
“Minha
vida não mudou muito, mas tenho a segurança de que isso é meu, de que ninguém
irá me tirar”, diz a vendedora. Maria poderia ser o exemplo do combate contra a
desigualdade que começa com um simples papel, se não fosse pelo fato de que o
Brasil há anos tropeça no mesmo desafio: o país não sabe oficialmente quantas
pessoas vivem na irregularidade, sem títulos de propriedade. Sabe que o
problema vai além das favelas revelando a desordem de seu crescimento urbano
nas últimas décadas. Sem políticas habitacionais para todos, os trabalhadores
mais pobres foram ocupando terrenos e hoje dezenas de milhares de domicílios de
bairros integrados nas cidades também não aparecem nos registros imobiliários.
Oficialmente, não são casas de ninguém.
Vista da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro. |
“No
Brasil, estima-se que esse número chegue a 50% dos imóveis, que permanecem fora
da economia formal. Segundo o renomado economista peruano Hernando de Soto, em
sua obra O Mistério do Capital, uma das principais causas do subdesenvolvimento
histórico dos países latino-americanos seria, justamente, o elevadíssimo grau
de irregularidade fundiária de seu território, pois o imóvel regular (e apenas
esse) continua sendo a principal garantia do capital”, explica o advogado
Marcos Prado, da Souza Cescon Advogados, especializado em regularização
fundiária. “Em uma sociedade plenamente regular a titularidade pode ser
considerada uma coisa de pouca importância, mas numa sociedade tão complexa e
desigual como a do Brasil, o registro tem um valor imenso, porque alavanca o
preço do imóvel e dos empréstimos”, avalia Sergio Magalhães, presidente do
Instituto de Arquitetos do Brasil.
Na
Argentina, onde o presidente Mauricio Macri acaba de lançar a promessa de
entregar títulos de propiedade há cerca de 1,5 milhão de pessoas morando em
favelas, mas no Brasil são cerca de 11,5 milhões, quase 6% da população, de
acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na cidade
do Rio de Janeiro, 22% de seus habitantes ocupam esses bairros onde a
improvisação de infraestrutura básica costuma ser a regra e os títulos de
propriedade, exceção. Luiz Inácio Lula da Silva começou sua presidência em 2003
prometendo registros de propriedade para milhões de pessoas, metas de governo
para combater a desigualdade, estimular o crédito e a economia local. Mas o
plano, tão complexo como as leis e burocracias brasileiras, não funcionou,
assim como o de tantos outros prefeitos e governadores em busca da popularidade
entre os mais pobres. Diante da complexidade de se legalizar uma favela
inteira, são entregues poucos títulos aqui e acolá sem nunca acabar por
igualá-la à cidade. A informalidade foi se resolvendo com mais informalidade e,
onde não existe Estado, associações de moradores e ONGs assumem a função de
cartório para dar algum endereço postal ao caos.
A
menos de cinco quilômetros da casa de Maria, Renê Melo, de 40 anos, vive e
dirige uma padaria em uma das maiores favelas do Brasil e da América Latina. A Rocinha,
encravada no bairro rico de São Conrado, tem, segundo cálculos não oficiais das
associações de moradores, por volta de 200.000 habitantes: população maior do
que a cidade de Bragança Paulista concentrada em um morro. Um emaranhado de
fios cruza seus becos, o cheiro de mofo é forte e as águas do esgoto correm por
suas ruas, o narcotráfico continua impondo suas leis enquanto disputa o poder
com a polícia e o correio chega somente em alguns lugares graças à ajuda de
carteiros comunitários e do dono do bar que empresta seu endereço aos vizinhos.
Em um labirinto de construções superpostas, considerado um dos principais focos
de tuberculose de todo o país, não é nada fácil encontrar a rua 1, beco 10,
casa 55.
Renê,
como aproximadamente 90% de seus vizinhos, não tem o título de propriedade da
casa que seus pais compraram na parte mais alta do bairro, onde somente se
chega após prévia autorização do traficante considerado o dono da favela. Agora
que sua mãe já é idosa, decidiram se mudar a uma parte mais acessível e
passaram a pagar um aluguel de 1.000 reais. “Deixei minha casa vazia, porque
preciso reformá-la antes de poder alugar. Mas de onde tiro o dinheiro? ”,
questiona. “Se conseguisse um empréstimo não só poderia reformar a casa como
compraria algumas máquinas para o meu negócio, para fazer pães diferentes.
Compraria cadeiras e mesas para abrir a padaria de noite como pizzaria. Mas sem
título de propriedade o banco nem te recebe”, completa.
“A
exclusão começa com a falta de propriedade”, afirma Paulo Rabello Castro, hoje presidente
do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e que em 2008
liderou como advogado, pro bono, um projeto para regularizar as quase 1.500
casas da favela do Cantagalo, entre os turísticos bairros de Ipanema e
Copacabana. Era um projeto piloto que buscava segurança, crescimento e
reconhecimento, mas “a burocracia e a política emperraram o processo”, lamenta
Rabello, frustrado porque depois de nove anos os títulos ainda não foram
entregues. Rabello, defensor do estímulo econômico que significa integrar uma
comunidade inteira ao sistema e não somente um punhado de casas, afirma: “Não
adianta investir milhões em assistência social. Se alguém se vê com uma
condição patrimonial diferente do resto, por mais que você o cubra de ouro,
continuará sentindo-se excluído”. Renê, a sua maneira, diz o mesmo: “É uma
falta de respeito. Se todos nós vivemos no mesmo buraco e pagamos os mesmos
impostos, por que uns têm algo que outros não têm?”.
AS
INFORMAÇÕES SÃO DO EL PAÍS
EDIÇÃO
DA AGÊNCIA BALUARTE
Assinar:
Postar comentários
(Atom)
Postagens mais visitadas
-
A nudez despudorada POR FERNANDO ATALLAIA DIRETO DA REDA ÇÃ O Um grupo de mulheres vem tirando a roupa nas noites de São Luís ...
-
Profissional da Segurança esteve na linha de frente do diálogo que levou categoria a novas isenções pela Gestão municipal POR FERNANDO ATALL...
-
Artista não resistiu às complicações neurológicas provocadas por um grave Acidente Vascular Cerebral (AVC). Ele estava internado desde a sem...
-
Pleiteando uma das vagas no Legislativo ludovicense, médico pioneiro na concepção, implementação e difusão de projetos voltados à saúde ment...
-
Candidata a vereadora pelo PL, enfermeira apoia o médico Dr. Julinho à reeleição e nas recentes enquetes realizadas pelos ribamarenses nas r...
-
LETRAS E CANÇÕES Leia na íntegra a letra da canção inédita Dois Passos, de autoria do cantor e compositor maranhense Fernando Atallaia...
-
Cidade devassada pelo descaso enxerga no projeto político do empresário oportunidade de sair em definitivo do limbo do abandono a partir des...
-
O jornalismo da Band destacou a polêmica envolvendo dança da cantora de funk e professora Tertuliana Lustosa durante seminário na institui...
-
Região do Baixo Parnaíba atrai cada vez mais atenção dos maranhenses preocupados com o progresso local POR FERNANDO ATALLAIA EDITOR DE M...
-
O médico Ruy Palhano, candidato a vereador com o número 30 001, conclamou a população ludovicense a se unir à sua campanha para a construção...
Pesquisar em ANB
Nº de visitas
Central de Atendimento
FAÇA PARTE DA EQUIPE DA AGÊNCIA DE NOTÍCIAS BALUARTE
Denúncias, Sugestões, Pautas e Reclamações: agencia.baluarte@hotmail.com
atallaia.baluarte@hotmail.com
Sua participação é imprescindível!
Denúncias, Sugestões, Pautas e Reclamações: agencia.baluarte@hotmail.com
atallaia.baluarte@hotmail.com
Sua participação é imprescindível!
0 comentários:
Postar um comentário