quarta-feira, 17 de maio de 2017
A corrida de obstáculos de João Doria, o
prefeito de São Paulo que já flerta com 2018
Prefeito cogitou pela primeira vez disputar prévias no PSDB para se postular ano que vem
Entre desafios estão a disputa com mentor Alckmin e a tarefa de "se inventar" no Nordeste
Prefeito cogitou pela primeira vez disputar prévias no PSDB para se postular ano que vem
Entre desafios estão a disputa com mentor Alckmin e a tarefa de "se inventar" no Nordeste
Desde que Fernando
Henrique Cardoso passou a faixa presidencial para Luiz Inácio Lula da Silva em
1º de janeiro de 2003 os tucanos sonham em voltar ao Planalto. O senador José
Serra tentou duas vezes e perdeu. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin,
foi derrotado uma vez, e recentemente Aécio Neves completou o rol de fracassos
eleitorais do PSDB na seara. A disputa interna que jamais abandona os tucanos
ganhou de vez um neófito, o prefeito de São Paulo, João Doria. Em Nova York
para receber um prêmio e falar a investidores, Doria, que ocupa seu primeiro
cargo eletivo apenas desde janeiro, flertou abertamente com uma candidatura em
2018 — o mais claro que chegou até agora ao falar do tema. Em entrevista à
agência Bloomberg, disse que concorreria caso fosse escolhido em prévias no
PSDB: "Respeitando a democracia, por que não?
Num cenário de terra
arrasada na política com a Operação Lava Jato, o prefeito que se apresenta como
"gestor" ganha destaque e foi o tucano mais bem posicionado nas
simulações de 2018 publicadas pelo Datafolha no começo do mês — nas quais Lula,
alvo da artilharia máxima da operação, segue em primeiro. Incluído pela
primeira vez no levantamento, Doria, que tem buscado polarizar com o petista
nas redes sociais, apareceu com entre 5% e 11% dos votos a depender do cenário.
E, à diferença do ex-presidente e dos demais tucanos, com baixa rejeição: 16%.
"Será o candidato do PSDB para presidente da República aquele que tiver a
melhor posição na opinião pública para vencer o PT e o Lula", lançou o
prefeito dias atrás.
Na capital paulista, Doria surfa em uma onda de popularidade, impulsionado por algumas medidas polêmicas que cumprem sua promessa de campanha, como o aumento da velocidade nas marginais. Usando o mesmo mote da disputa eleitoral, o de João Trabalhador, o tucano e ex-apresentador de TV imprimiu um ritmo de reality show à comunicação da prefeitura. |
A maior parte dos
analistas adverte que é cedo para fazer prognósticos com tanta antecedência e
num cenário eleitoral instável, inclusive na economia. Mas, feitas as
ressalvas, dizem que já são claros, logo de partida, os vários obstáculos que
Doria enfrentará para pôr seu nome na cédula de forma competitiva. O primeiro
deles será o de vencer a guerra interna no PSDB. Depois, o de ter uma
administração convincente e bem avaliada e explicar ao eleitor sua eventual
saída precoce do posto, sem falar na necessidade de calibrar seu discurso por
vezes intempestivo e de "se inventar" no resto país, especialmente
Nordeste, onde Lula segue forte.
Guerra interna
Apadrinhado político
do governador Alckmin, Doria agora caminha em campo minado ao tentar atrair
atenção para o seu nome, inclusive internacional, sem melindrar o mentor que
apostou nele para a prefeitura e ganhar o carimbo de "traidor".
Alckmin não esconde sua ambição de concorrer em 2018, não sem constrangimentos.
Na viagem que compartilham nesta semana em Nova York, o governador tem sido
obrigado a dedicar muito tempo tanto para comentar as chances do pupilo como
para negar sinais de rompimento.
“Doria é um candidato
natural, porque os grandes tucanos estão em maus lençóis. O Alckmin, além da
Operação Lava Jato, tem o problema dos trens [escândalo do trensalão]”, afirma
o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília. Outros nomes
presidenciáveis do PSDB, José Serra e Aécio Neves, também tem de responder a
acusações na Lava Jato.
Ainda assim, não é
tarefa fácil ser um outsider na máquina partidária e um sinal evidente
foi a exclusão do prefeito neotucano do programa gratuito do PSDB na TV no
começo do mês. Luciano Dias, do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos,
acredita que Doria só tem chances de ser escolhido pelo partido caso Alckmin
seja carta fora do baralho. “Existe uma fila partidária que costuma ser
seguida. Aécio tentou em 2014, agora é a vez de Alckmin. Todo o marketing que o
Doria tem não se traduz em possibilidade dele se candidatar pelo PSDB, tampouco
em votos”.
Coleira e Nordeste
Na capital paulista,
Doria surfa em uma onda de popularidade, impulsionado por algumas medidas
polêmicas que cumprem sua promessa de campanha, como o aumento da velocidade
nas marginais. Usando o mesmo mote da disputa eleitoral, o de João
Trabalhador, o tucano e ex-apresentador de TV imprimiu um ritmo de reality
show à comunicação da prefeitura, com crescimento importante de seguidores nas
redes sociais. Por outro lado, também chama a atenção reações suas consideradas
agressivas ou desproporcionais, como chamar de "vagabundo" quem
aderiu à greve geral de março contra as reformas do Governo Michel Temer ou
jogar fora uma flor recebida de uma ativista crítica do novo aumento das mortes
nas marginais.
"Pelas reações
de Doria, alguém terá que pôr uma coleira nele e não deixar que ele reaja com
seu instinto. Ele também vai ter que aprender a responder sobre o imponderável
e sobre coisas que ele não sabe, coisa que se aprende fazendo muitas campanhas,
mas que tem gente para ensinar", diz Fernando Limongi, da Universidade de
São Paulo.
Doria tem buscado
falar de temas nacionais que possam consolidá-lo como nome anti-Lula
nacionalmente. Foi assim durante a greve geral e foi assim nos dias que
antecederam ao depoimento de petista na Operação Lava Jato, na semana passada.
O deputado federal Heráclito Fortes (PSB-Piauí) encorajou Doria a alçar voo
fora de São Paulo, afirmando que em seu Estado natal todo mundo pergunta “quem
é esse Doria”. O tucano comemorou, e usou as redes sociais para dizer que fica
“feliz em saber que nosso trabalho está despertando curiosidade em todo país”.
Mas ao contrário do que faz crer o parlamentar piauiense, a tarefa de
conquistar os Estados onde Dilma Rousseff bateu Aécio em 2014 não será fácil
num terreno onde o PT segue forte. "Doria terá que ser inventado no
Nordeste, sua imagem (terá de ser) construída. Isto não vai ser fácil de se
fazer, sobretudo sem apoio de redes partidárias e com pouco dinheiro", diz
Limongi.
O cientista político
Adriano Oliveira, da Universidade Federal do Pernambuco, aposta que caso
mantenha o mesmo discurso “liberal de empresário” usado em São Paulo, Doria
terá dificuldades de conquistas os eleitores do Norte e Nordeste. “Essa
retórica que opõe o João trabalhador, empresário, gestor, ao que ele
considera como sendo o PT corrupto tem vazão em parte dos brasileiros. Mas
outra parcela da população dessas regiões é estadólotra [favorável a uma
maior presença do Estado], defende as políticas sociais da era Lula”, afirma
Oliveira. Logo, para obter sucesso em âmbito nacional, Doria teria que
“incorporar a ideia de que o Estado deve ajudar quem precisa”.
O professor também
aponta que é preciso separar o petismo do lulismo: “Quando Doria foi eleito o
PT estava no auge da crise com o impeachment de Dilma e a Lava Jato. Mas o Lula
já começou a se reerguer, o lulismo é maior do que o petismo”. É no Nordeste,
por exemplo, que o presidente Michel Temer (PMDB) tem seu maior índice de
rejeição: 67%, de acordo com pesquisa Ibope divulgada no final e março. Durante
os governos petistas a região passou por um "ciclo virtuoso", que
trouxe crescimento econômico, distribuição de renda e uma série de políticas
desenvolvimentistas.
O historiador Altemar
da Costa Muniz, da Universidade Estadual do Ceará, acredita que as críticas
constantes de Doria a Lula podem ser um empecilho ao prefeito para conquistar o
eleitorado nordestino. “A popularidade do ex-presidente ainda é muito grande na
região, principalmente nas camadas mais populares. Basta ver a multidão que
acompanhou Lula na inauguração não-oficial de um trecho da transposição do São
Francisco em março”, diz o professor. Ele também afirma que o eleitor
nordestino é menos volátil. “O eleitorado paulista é atípico. Elege Fernando Haddad e na
sequência João Doria. Vota na Luiza Erundina e depois em Paulo Maluf. Nesse
sentido o eleitorado do Nordeste é mais compreensível, ele surpreende menos com
guinadas”, afirma.
Dias, do Instituto
Brasileiro de Estudos Políticos, acredita que não é possível generalizar o
comportamento do eleitor do Norte e do Nordeste. “Acho que nas capitais do
Nordeste o efeito Doria seria semelhante ao que ocorre em São Paulo. Salvador,
por exemplo, elegeu e reelegeu um prefeito de direita [Antônio Carlos Magalhães
Neto]”, diz. Segundo o professor, os eleitores do interior tem uma tendência a
votar em candidatos do Governo. “Foi assim desde a época do Fernando Henrique
Cardoso. Esse eleitorado tende a votar em candidatos governistas, então o
sucesso o fracasso de Doria com essa parcela da população dependeria do apoio
do PMDB”, afirma.
AS INFORMAÇÕES SÃO DO
REPÓRTER GIL ALESSI, DO EL PAÍS
EDIÇÃO DA AGÊNCIA
BALUARTE
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