sábado, 24 de dezembro de 2016
Eu, odiado
Por José Luiz
Oliveira de Almeida
Esse fato já aconteceu há algum tempo, mais
precisamente no dia 03/02/2015, às 20h45min. Contudo, só agora, depois de ter a
certeza de que não me deixaria levar por um sentimento menor, resolvi tecer
alguma consideração a respeito, mesmo porque esse é um período – natalino - que
favorece esse tipo de reflexão, quando o fazemos sem nos deixar levar pelo ódio
e pelo espírito de vingança.
Pois bem. No dia e hora acima mencionados, recebi
no meu blog – joseluizalmeida.com- a
manifestação de um leitor, à guisa de comentários, no mínimo deselegante e
desumana, a qual resolvi hoje compartilhar com os meus amigos e com aqueles
que, mesmo sem ser amigos, me conhecem e sabem – pelo menos é o que penso - que
não sou do tipo descrito nos comentários, sobre os quais me deterei a seguir.
Nos comentários em referência, o leitor - ou
inimigo, sei lá! -, cujo nome não vou
mencionar porque não sei se é verdadeiro ou falso, me chama, dentre outras coisas,
de desumano e injusto, além de ser odiado por todo mundo, inclusive pelos
funcionários do Tribunal de Justiça, o que me causou grande estupefação, pois,
afinal, tendo capacidade de discernimento, não é isso o que constato no meu dia
a dia.
Nos mesmos comentários, o anônimo – ou não
tão anônimo assim - diz, ademais, que a sociedade me tem em conta de um tirano,
um homem mau, pessoa ruim. Em seguida, insiste em afirmar que, no meu local de
trabalho, sou uma unanimidade, ou seja, odiado por todos.
Noutro fragmento - e aí coloca no mesmo
nível todos os julgadores da minha câmara -, diz que a 2ª Câmara Criminal, na
qual atuo, é uma câmara de gás, comparando-nos, com essa qualificação, a
Hitler, aduzindo, de mais a mais, que até mesmo Jesus Cristo, se fosse julgado
por nós, morreria na cadeia. Não satisfeito, depois de reafirmar que não passo
de um tirano, deseja para mim um bom lugar no inferno.
Tais comentários, como se vê, são uma
agressão a minha pessoa, não só como magistrado, mas também como homem de
família, Tais comentários, porque os entendo injustos, bem assim os adjetivos
assacados contra mim, me deixaram agastado, conquanto, para amenizar, me visse
tentado a fazer, em face dele, um juízo crítico de compreensão, para concluir
que o agressor, seguramente, é alguém que não tenha sido beneficiado por uma
decisão da minha lavra, o que lhe retira a isenção do julgamento que faz.
Anoto, todavia, que, por ser homem público e
por já ter me sentido injustiçado em outras oportunidades, procuro lidar com as
críticas com toda a isenção possível, tentando sorvê-las como algo inevitável,
em face do exercício das minhas atividades, mesmo porque não há homem público
que escape das críticas, muitas das quais graciosas.
Quero deixar consignado, no entanto, que o
missivista comete um grave erro de avaliação quando generaliza, ao dizer que a
sociedade me odeia, pois imagino que isso seja apenas fruto de sua mente,
obliterada em face de algum interesse contrariado, afinal, ninguém lança críticas
tão mordazes a alguém, senão em face de um sentimento menor.
O que me apraz, o que me conforta, o que me coloca
de pé e me fortalece é a certeza de que não é essa a imagem que as pessoas que
me conhecem têm de mim. Não sou santo, erro aqui e acolá, cometo injustiças,
mas nunca o faço por vendeta ou por maldade, movido pela má-fé.
Importa consignar, a propósito, que tudo na
vida depende dos olhos de quem vê, motivo pelo qual Protágoras dizia, com
sabedoria, que o homem é a medida de todas as coisas. Também por isso, os mais
renomados pensadores reafirmam que a interpretação dos fatos depende do ponto
de observação do interprete, de seus valores, ideologia e idiossincrasias.
Aliás, para emprestar uma conotação
literária ao tema e para ratificar que o resultado da interpretação depende do
intérprete, relembro uma passagem do romance Helena, de Machado de Assis, na
qual Estácio e a própria Helena refletem sobre a passagem do tempo, com visões
diferentes.
Estácio – A riqueza compra até o tempo, que
é o mais preciso e fugitivo bem que nos coube. Vê aquele preto que ali está?
Para fazer o mesmo trajeto que nós, terá de gastar, a pé, mais uma hora ou
quase.
Helena – Tem razão. Aquele homem gastará
muito mais tempo do que nós em caminhar. Mas não é isso simples questão de
ponto de vista? A rigor, o tempo corre do mesmo modo, quer o desperdicemos, quer
o economizemos. O essencial não é fazer muita coisa no menor prazo; é fazer
muita coisa aprazível ou útil. Para aquele preto, o mais aprazível é, talvez,
esse mesmo caminhar a pé, que lhe alongará a jornada, e lhe fará esquecer o
cativeiro, se cativo. É uma hora de pura liberdade.
Como entremostra o diálogo, tudo depende do
ponto de vista de cada um. A vítima de um crime de roubo, por exemplo, decerto
se sentirá feliz com uma decisão que mantenha preso o seu algoz; enquanto este,
sua família e amigos, decerto se sentirão ultrajados em face da denegação de um
habeas corpus, que o faria retornar ao convívio social e, quem sabe, cometer
novos crimes. Numa ou noutra hipótese, alguém ficará
contrariado, e o juiz, claro, é quem arca com as consequências da decisão, para
o bem ou para o mal.
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