terça-feira, 20 de janeiro de 2015
Morte de Alberto Nisman causa estranheza em Buenos Aires
O procurador que acusava Cristina Kirchner de acobertar iranianos acusados por atentado contra comunidade judaica é encontrado morto na capital argentina
Carta Capital com edição da Agência Baluarte
A possibilidade de que a população argentina descubra a verdade a respeito do atentado contra a Associação Mutual Israelita Argentina (Amia), ocorrido em 1994 e até hoje o mais grave da história da Argentina, ficou menor nesta segunda-feira 19. Horas antes de comparecer ao Congresso para detalhar as acusações de acobertamento dos culpados contra a presidente Cristina Kirchner e outros políticos importantes, o procurador Alberto Nisman foi encontrado morto em seu apartamento, no bairro de Puerto Madero, área nobre de Buenos Aires.
Há poucos detalhes sobre a morte até aqui. A promotora Viviana Fein, responsável pela investigação da morte de Nisman, confirmou seu falecimento por uma arma de fogo, calibre 22, encontrada junto ao seu corpo. Nisman tinha uma equipe de segurança formada por dez policiais, que não estava com ele no momento do crime. Segundo o jornal Clarín, Nisman pedira aos guarda-costas que fossem buscá-lo no domingo. Quando chegaram e não conseguiram entrar em contato com o procurador, os seguranças chamaram sua mãe, que entrou no apartamento e encontrou o corpo do filho.
Alberto Nisman
Alberto Nisman em evento em 2013: o procurador temia ser assassinado
Também no Clarín, a jornalista Natasha Niebieskikwiat, dedicada ao caso investigado por Nisman, escreveu que ele não respondeu suas mensagens enviadas pelo telefone celular no domingo. Niebieskikwiat afirmou, entretanto, que as mensagens apareciam como tendo sido recebidas pelo procurador. Por duas vezes, afirma a jornalista, Nisman manifestou preocupação com sua segurança. "Eu posso sair morto disto", afirmou o procurador à jornalista em duas oportunidades.
Héctor Timerman, por participarem de um suposto plano para acobertar o Irã de suas responsabilidades no atentado contra a Amia. O governo iraniano e o grupo libanês xiita Hezbollah foram apontados como responsáveis pelo ataque, que deixou 85 mortos em 18 de julho de 1994. Cinco ex-funcionários iranianos, entre eles um ex-presidente, atuais ministros e lideranças religiosas locais têm uma ordem de captura internacional da Interpol contra eles, a pedido da Justiça argentina.
MUITO ESTRANHO  Nisman denunciou a presidente Cristina Kirchner(FOTO) e outros funcionários de alto escalão do governo por considerar que, em 2011, começou-se a "negociar um plano de impunidade e para acobertar os foragidos iranianos acusados da explosão da mutual judaica". 

Nisman denunciou a presidente e outros funcionários de alto escalão do governo por considerar que, em 2011, começou-se a "negociar um plano de impunidade e para acobertar os foragidos iranianos acusados da explosão da mutual judaica". De acordo com a denúncia de Nisman enviada à corte federal do magistrado Ariel Lijo, o governo da presidente Kirchner bolou um "sofisticado plano criminoso" destinado a favorecer o Irã e a desvincular definitivamente os suspeitos que são procurados pela Justiça argentina.
O procurador classificou de "manobra" a estratégia do governo, que levou à assinatura de um Memorando de Entendimento com Teerã, em 2013, com a participação do chanceler Héctor Timerman, do deputado nacional Andrés Larroque e do líder comunal Luis D'Elía. Nisman sustenta que há provas de que a posição oficial do governo foi motivada "pelo petróleo iraniano", porque "se buscava restabelecer relações comerciais de Estado a Estado, sem prejuízo das trocas que já existiam em nível privado".
A assinatura do memorando de entendimento com o Irã, denunciado como "inconstitucional" pela Amia e por outras organizações judaicas, tensionou as relações entre o governo kirchnerista e a comunidade de cerca de 300 mil judeus da Argentina, a maior da América Latina. Na semana passada, integrantes da comunidade judaica argentina receberam a denúncia de Nisman com cautela, enquanto o governo Kirchner classificou a acusação de "ridícula". A Delegação de Associações Israelitas Argentinas (Daia), que reúne 140 instituições judaicas do país, manifestou sua "comoção e surpresa" com a denúncia. "Recebemos essa notícia com profunda preocupação. Para a Daia, a causa Amia é uma questão de Estado", disse seu presidente Julio Schlosser. O secretário-geral da Presidência, Aníbal Fernández, lembrou que a política externa da Argentina não é feita apenas pela Casa Rosada. "A presidente tem o poder de firmar tratados, e o Congresso deve aprová-los. É sem sentido o que está acontecendo (...) Por que não chamou para indagação todos os senadores e deputados que votaram?".
Depois da repercussão da denúncia, o procurador Nisman foi chamado a comparecer nesta segunda-feira à Comissão de Legislação Penal da Câmara de Deputados para detalhar sua investigação. Seu depoimento era aguardado como um momento emblemático em uma investigação que dura 20 anos, é recheada de denúncias de acobertamentos e incompetência e que jamais levou algum dos culpados à Justiça.

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