segunda-feira, 14 de setembro de 2015
Fernando Atallaia é um artista
multimídia-jornalista, compositor, poeta, músico, blogueiro, cantor, produtor e crítico cultural–
com vocação para projetar uma singular presença nas letras e nas artes
maranhenses, cujo melhor destino sempre foi o de refinar, em espírito, a civilização
nacional.
Assim foi e assim será. Desde o Grupo Maranhense que a Tribo Timbira concorre, de maneira decisiva, para a afirmação do humanismo brasileiro, trilhando os caminhos descerrados pela poesia universal de Gonçalves Dias, pela tradução recriadora de Odorico Mendes, pelo cânone linguístico de Sotero dos Reis, pelo universo matemático de Gomes de Souza e, no mínimo, pela filosofia moral de João Lisboa e pela multibiografia plutarqueana de Antônio Henriques Leal.
A fertilidade do Grupo Maranhense
perpassou a historiografia, com César Marques, o direito, com Candido Mendes e
a política, com Luís Antônio Vieira da Silva, antecedidos, todos, pela
fulgurante presença de José Cândido de Morais e Silva, o Farol, entusiasta das
causas cívicas mais relevantes da vida pública brasileira, em seu processo
sinuoso de conquista e de afirmação da autonomia nacional.
Há traços constantes na tessitura da
trajetória do Grupo Maranhense, dentre os quais podem ser destacados a poesia e
o jornalismo. O sopro poético perpassou os interesses intelectuais da
totalidade maranhense dos fundadores do humanismo brasileiro, do que não existe
testemunho mais conclusivo do que a presença criadora de Gonçalves Dias,
artífice incontrastável do verso na literatura brasileira, que conviveu com
Odorico Mendes, o qual prestigiou o vernáculo, vertendo para a língua
portuguesa a poesia épica universal de Homero e de Virgilio, advinda dos
universos gregos e romanos. E mais: interesse poético eloquente, que alcançou e
envolveu o matemático astrônomo e pensador Gomes de Souza, o da Anthlogie Universelle, reunião do que
lhe pareceu existir de melhor na lírica internacional, publicada em Leipzig,
nos idos de 1859, por F.A.Brockhaus, a demonstrar que o zero da matemática e o
infinito da poesia são irmãos, conforme reivindicava o poeta e calculista
Joaquim Cardozo.
Com o jornalismo não foi diferente. A
mais alta linhagem da inteligência maranhense se vinculou à tradição das
folhas, a começar por José Cândido de Morais e Silva, o Farol, logo desdobrado
nas consulares presenças de João Lisboa, Sotero dos Reis e Joaquim Serra, no
evolver de gerações que ganhariam os tempos e reclamariam para si, já no século
XX, o concurso de Nascimento Moraes, Neiva Moreira, Franklin de Oliveira, Odylo
Costa, filho, Bandeira Tibuzzi, Francisco do Couto Corrêa, José Sarney, Lago
Burnett, Ferreira Gullar e Pires de Saboia. Fundadores de jornais, renovadores
do jornalismo, dirigentes de cadernos especiais, editores e editorialistas, bem
como historiadores do jornalismo, os maranhenses transformaram as folhas em
veículos de ideias, conferindo uma consistência única às causas democráticas
brasileiras e internacionais, como aconteceu com Joaquim Serra e o
abolicionismo e com Neiva Moreira e a emancipação dos povos.
A carruagem da história cultural
transitou a favor do Maranhão, fiel a si mesmo, na confirmação renovada de sua
presença na cultura brasileira. Reiterar multiplicado de possibilidades, por
meio da prosa de ficção de Aluizio de Azevedo, da etnografia e do folclore de
Celso de Magalhães, do conto e do teatro de Arthur Azevedo, da ourivesaria em
versos de Raimundo Corrêa, do romance de Coelho Netto, da poligrafia de Graça
Aranha, da doutrina de Teixeira Mendes e do cancioneiro de Catulo da Paixão Cearense,
selando um casamento de amor com a cultura espiritual.
Escola das artes e das letras, a
paisagem cultural maranhense permaneceu fértil século XX afora, na contratura
de gerações a encontrarem mestres como Antônio e Raimundo Lopes, que fomentaram
e inspiraram talentos como os de Nunes Pereira, nos estudos antropológicos; Josué
Montello, na prosa de ficção; Ignácio Rangel, na teoria econômica; Franklin de
Oliveira, na filosofia da cultura; Odylo Costa, filho, no verso, na prosa e no
jornalismo; Neiva Moreira, no jornalismo político e libertário; Antônio de
Oliveira, na crítica literária; Oswaldino Marques, no pensamente estético; e
Manoel Caetano Bandeira de Mello, na linhagem poética de Gonçalves Dias e de
Raimundo Corrêa.
Mais recentemente, a floração
intelectual revigorada do Maranhão, por diferentes caminhos, encontrou na
reiterada fonte da cultura revigorante destino, expresso nas vozes e nas
presenças mais do que expressivas de Ferreira Gullar, Bandeira Tribuzzi, José
Sarney, João Mohana, José Chagas, Bernardo Almeida, Nascimento Morais Filho,
Nauro Machado, José Louzeiro e Arlete Nogueira da Cruz Machado. A polimorfa
contribuição maranhense à cultura nacional, no verso, na prosa, no ensaio, na
oratória, nas artes cênicas, enfim, em todas as manifestações do espírito, em
si mesma, constitui um título de confirmação de que essa subjetividade
comunicante é o quê de melhor distingue a Tribo Timbira na civilização
brasileira, demarcando a sua inestimável e construtiva presença criadora.
Fernando
Atallaia, autor deste poemário intitulado Ode Triste para Amores Inacabados é, por excelência, herdeiro de uma tradição de cultura, que projeta no
verso, na prosa, bem como na música, autor que é de mais de trezentas canções.
Como ninguém floresce sozinho, Fernando Atallaia, integrante do Grupo
Carranca de Poesia, irrigou a sua presença em todos os movimentos culturais que
fertilizaram o Maranhão na viragem do século XX para o século XXI. Mauro Ciro,
Bioque Mesito, Hagamenon de Jesus, Antônio Aílton, Dyl Pires, Ana Teixeira, Ciro Falcão, Ricardo Leão, Paulo Melo Sousa e Samarone Marinho são seus companheiros de viagem, na aventura cultural vivenciada com
sentido universalista, na rua de nossa comum aldeia, como recomendava Leon
Tolstoi.
O canto sutil entoado por Fernando Atallaia,
nesta Ode
Triste para Amores Inacabados, com certeza,
configura um artefato literário construído na emoção de tijolo sobreposto a
tijolo, em busca da ambicionada simetria, com a qual a vida vivida possa ser
redimensionada enquanto sentido, quando confrontada com tudo quanto é
fraturado, inconcluso, dispare, bipolar, contrastante e melancólico. Trata-se
de uma aguda manifestação refletida de sentimentos, que entre a reta e a curva
procura o fio condutor dos labirintos de Creta da existência, com uma ambição
de unidade frente à vida do mundo em estilhaços, ora recompostos na harmonia do
canto poético.
Desde Mônica Matos, “que
não merece este poema”, mas a quem o cantor suplica: “Casa-te comigo e me
calo”, até a sua mais intima confissão: “Tenho de pedras as mãos”, porém,
“tenho os ossos na poeira”, os versos de Fernando Atallaia caminham na direção das liquefeitas
consistências, pois “A casa é fortaleza para pele”. No arcabouço das eternas
brevidades, a narrativa poética prossegue como testemunho de que “os poetas
vagabundeados de aurora” são seres que podem dizer aos tempos: “Dores à parte
eu também amei”, sob a dinâmica da fatal pergunta: “Quem sabe do amor mais que
eu que amei de muletas?”.
Fernando Atallaia entretece o seu
contrastante canto entre o verso e a prosa, mas sempre com a poesia, em razão
do timbre, da dicção e do ritmo subjacentes ao jogo de imagens com o qual
trabalha sem descanso – “Minha alma disposta ainda pula muros” – até
reencontrar no devenido os improváveis amanhãs resgatados entre sóis morrentes
e redivivos, que galos nenhuns anunciaram ou renegaram três vezes:
“Quem
ensaiava o hino nacional apanhando na palmatória da consciência nem entendia o
que era dor
Continuava a cantar mais alto gritando a liberdade que perfurava os
olhos e os pulmões
Era
uma morada de sonhos em desalinho alinhados para o amanhã de toda hora
Sem contemplar o sol morrendo nos dias indo para os braços da lua ninguém sentia que a luz criava Sombras no arco-íris
Por isso eles eram felizes muito felizes
Conseguiam queimar fogueiras sem temer os sóis que eram irmãos e nasciam”.
Existe uma memorável
tradição de poesia em prosa, de prosa com poesia, de prosipoemas na literatura
universal, que se encontra, em perspectiva próxima, entre Charles Baudelaire e
Kalil Gibran, para ser econômico. Se se quiser recorrer a um horizonte
distante, os Cantares de Salomão, na Bíblia Sagrada, dela configuram um
testemunho mais do que valioso, pela glorificação espiritual do amor físico, de
que a poesia de Fernando Atallaia se encontra perpassada, na fugaz tentativa de
transformação do tempo em eternidade:
“Vem o meu e o teu dedo
Alforriados
da dor que nos afligia
E vem o tempo que nos irradia
Vem o meu e o teu dedo
E de velho um novo dia
Num arco-íris feito de anéis alianças
E sóis que desvendamos
Até o dia em que o ouro perde o brilho
E nossas mãos se desvencilham
Num arrancar de dedos”.
Esta pulsão
de encontro espiritual por meio das faíscas dos girassóis acesos nas brasas do
mundo físico é um fio condutor na poética de Fernando Atallaia: “Demorei anos para construir este
serralho / Demorei
séculos para gozar neste latifúndio”, sob a fatalidade de desencontros marcados por inconclusos amores que inspiram
tristes odes: “Nada de concreto guarda a vagina que
alimenta o sonho de um orgasmo”. Qualquer coisa de divino a ser buscada entre o
gelo e o fogo, na transitória salvação dos que desvelam no precário as ilhas
afortunadas de alguma esvaída eternidade, entre o sal e o mel:
“O padrinho das ninfas em auroras sedentas –extintas
O entregador de rosas à motocicleta veloz
O algoz da
tristeza apática das damas lançadas à ausência
O empalador das fêmeas entredentes
O ardor ao léu
Meu nome?
Meu nome é Jean Yves Lecastel
Nasci entre brechas nas frestas escuras do afeto
Nasci entre brechas nas frestas escuras do afeto
A ver a pele sangrar no dorso de mamilos rejeitados
Quais nascimentos sem odores
Ao gosto do fel o nome necessário
Do zelo no romper dos himens ao pesadelo
Dos senhores frios congelados
Frios patriarcas de castelos
A nudez da
princesa era o que clamava
Debruçada entre cavalos ela no crepúsculo adormecia
E o tempo lhe trazia até as mãos que já tocavam
Ali no despertar de suas saias a me sugar todo mel
A me sugar todo mel
Meu nome?
Meu nome é Jean Yves Lecastel”.
Este talvez
seja o fio condutor de Ode Triste para
Amores Inacabados: o da busca da alegria nas
odes do absoluto, a esbarrar no contingente, a tropeçar no circunstancial e a
conhecer as quedas do condicionado, quando a íntima ambição é a do infinito e a
da eternidade. O agora e a finitude constituem aporias para a fome e a sede de
metafísica, presentes na descomunal vontade de, pelo prazer e pela beleza,
vencer a morte. Eis o substrato do alfa e do ômega da poesia de
Fernando Atallaia, que floresce “de um quarto escuro para olhar a claridade” e
encontra a solidez líquida da breve redenção no corpo do amor:
“Despertai das entranhas do desejo olho meu corpo
meu
Falo meu
Falo de amor nessa hora
Estátua em movimento desbunde em rotação
Minha mão inspira seios de lolitas e ninfetas
E que seja errante esse ser que busca
Ao encontro de Vivi Fernandes e Lara Stevens levo um poema que baba
Ao encontro de Vivi Fernandes e Lara Stevens levo um poema que baba
Chupo o verso da vulva insaciável e Hilda dorme para me sugar enquanto
gozo
Chupo e caio
Devo ir agora antes que o mundo se acabe”.
Enfim,
Ode Triste para Amores Inacabados, do poeta Fernando Atallaia possui dialogias que
rememoram ora Mário Quintana, ora Manoel de Barros, na sua magia de retirar da
quase prosa a sempre poesia. É quando Fernando, em cumprimento da promessa, vem
se tornando Atallaia, palavra que, no árabe – "at-talai'a" –, significa torre de vigia,
posto elevado, desde onde é possível vislumbrar as paragens adjacentes e
longínquas, para a defesa do castelo e dos territórios como quê sagrados, de
onde nasce, na hipótese, a asa da esperança. Que esta Ode Triste
para Amores Inacabados seja, portanto, a certeza
de novos e vindouros cometimentos, com os quais Fernando Atallaia conduza os
cantares maranhenses ao céu azul em que passeiam os albatrozes.
Rossini Corrêa é Conselheiro Federal da OAB,
Professor-Doutor e Advogado em Brasília. Filósofo do Direito, Corrêa é autor, entre
outros títulos, de Saber Direito-Tratado de Filosofia Jurídica; Jusfilosofia de
Deus; Crítica da Razão Legal; Bacharel, Bacharéis: Graça Aranha, discípulo de
Tobias e companheiro de Nabuco; Canto Urbano da Silva; Formação Social do
Maranhão; Baladas do Polidor de Estrelas; Teoria da Justiça no Antigo
Testamento; e Brasil Essencial: como conhecer o país em cinco minutos.
Pertence às Academias de Letras do Maranhão-AML, e Brasiliense, ABrL.
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Muito bom, Infelizmente a boa letra, a boa literatura, a boa poesia, tem de certa forma, sido esquecida nos galpões dos museus e nas paginas dos livros antigos e dos antigos mestres das artes literárias deste Maranhão e do país a fora.
ResponderExcluirMerecido. O cara é fera, SUCESSO...
ResponderExcluirMarcio-AV 13-MAIOBAO
Parabéns poeta! Você merece cada palavra da bela análise. Nos faz viajar nas palavras e frases milimetricamente e propositalmente subentendidas, que levam aos mais diversos julgamentos e pensamentos. Grande abraço poeta, continue nos presenteando com suas belas obras.
ResponderExcluirmuito bom! meu amigo Fernando merece esta homenagem é um artista de mão cheia sua musica é de uma profundidade poética e sua poesia é um funil do ser ( uma referencia aqui a Nauro machado) lindo texto Rossine Correa e merece ser publicado em outras mídias. parabens!
ResponderExcluirmuito bom! meu amigo Fernando merece esta homenagem é um artista de mão cheia sua musica é de uma profundidade poética e sua poesia é um funil do ser ( uma referencia aqui a Nauro machado) lindo texto Rossine Correa e merece ser publicado em outras mídias. parabens!
ResponderExcluirAtallaia com seu vigor poetico e compromisso social consegue unir arte e denuncia em favor da população, sendo ele mesmo um baluarte da Cultura do nosso tão sofrido MA, sou fã deste admiravels artista da musica e da nossa poesia. Salve Fernando, merecido reconhecimento do Dr. Rossini. Abraços e abraços.. Célia
ResponderExcluirO que falar sobre você ? se suas poesias e publicações expressa um pouco de você . somente posso dizer-te que merece esse reconhecimento pelo trabalho que realizas .Parabéns amigo Fernando Atallaia .
ResponderExcluirExcelente trabalho do poeta Fernando Atallaia,além de suas obras,vem resgatando a memória poética muito esquecida nos dias de hoje
ResponderExcluirParabéns, poeta!
ResponderExcluirEsse cara é daqueles que nascem pra fazer a diferença no Mundo como Mandela, Bob Marley, Martin Luther King, Gandhi, muito pesado Fernando Atallaia uma pessoa impar sem igual, único não existe igual no Maranhão. Parabens Grande Artista.
ResponderExcluirSergio Lima(UFMA)